sábado, 26 de dezembro de 2015

"Toda vez que um produto estreia, conto quantos atores negros têm", diz Zezé Motta

Zezé Motta (foto), 71, está na televisão há cinco décadas: começou na TV Tupi, atuou nas redes Manchete, Globo e volta às novelas como a Tia Joaquina, personagem do folhetim “Escrava Mãe”, da Rede Record.
Prevista para estrear em meados de outubro, substituindo “Os Dez Mandamentos”, a trama foi adiada em razão do sucesso da história bíblica. Deve estrear no início do ano que vem, ainda sem data definida. A ideia é que a novela inaugure a faixa das 20h na emissora.
“Escrava Mãe” é uma história derivada da novela “Escrava Isaura” e conta a trajetória da mãe da personagem vivida originalmente por Lucélia Santos. A novela irá ao ar inteiramente pronta.
As filmagens terminaram há um mês, nos estúdios da produtora Casablanca, no interior paulista. A atriz conversou com a coluna antes de uma gravação, em novembro.

Seu contrato com a Rede Record é por obra. É mais difícil trabalhar dessa maneira?
Ao mesmo tempo em que a gente lamenta quando não renova o contrato, é compreensível. Toda vez que termina eu fico: “E aí, como que fica?”. Nos próximos projetos da Record não tem personagem para mim.
Essa novela é atípica. Mas, quando a novela termina, eles dão uma olhada e dizem se tem personagem com seu perfil. Desde que consolidei minha carreira de cantora fico mais tranquila, porque sei que não fico desempregada. Sei que vou passar uns apertos, mas vou me dedicar a gravar meu disco, “O Samba Mandou me Chamar”.

Viola Davis, vencedora do Emmy neste ano pela série “How to Get Away with Murder”, foi a primeira atriz negra a ganhar o prêmio. No discurso, ela agradeceu a roteirista e produtora Shonda Rhimes por ter criado um papel tão interessante, uma advogada sexy e poderosa. Disse que os personagens não têm cor. Sente falta de personagens mais interessantes?
Sem dúvidas. Toda vez que a gente cobrava da imprensa, dos diretores e dos produtores essa quase invisibilidade do negro na mídia, eles diziam “ah, não, só conheço você, a Neusa [Borges], a Ruth de Souza”.
Onde estão os outros negros? Por que é fácil encontrar o ator branco e não o negro? Pensei muito nisso, e tivemos a ideia de criar um catálogo de atores negros.
Ficamos um ano fotografando, mas tivemos que parar por aí porque acabou o patrocínio. Demorou tanto a acontecer que acabou virando uma página na internet [criada em 2002, www.cidan.org.br]. Está parada, mas quando a gente via que tinha mais de 500 atores negros, só dos que foram registrados ali… E ficam procurando onde é que eles estão…
Você só vê um volume de atores negros, como nesta novela, quando o tema é escravidão. Mas já foi pior. Sou de um tempo em que se eu estava em uma novela, não tinha espaço para a Neusa Borges, porque somos contemporâneas. Quando tinha para o [Antonio] Pitanga, não tinha para o Zózimo [Bulbul].
Era um ator negro e uma atriz negra, geralmente fazendo papel subalternos. Nada contra fazer a empregada doméstica, a babá, a faxineira — absolutamente. Seria uma discriminação de uma classe importante na nossa cultura. Agora a gente já vê coisas diferentes. Toda vez que um produto estreia fico contando quantos atores negros têm. E vibro quando têm muitos.

Qual passou no teste?
Não tenho tido muito tempo para assistir a televisão, mas estou vibrando muito pela Taís [Araújo] e pelo Lázaro [Ramos, ambos da série da Globo “Mr. Brau”].





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